domingo, 25 de abril de 2010

Simples e belos

Não tenho mais dúvidas: Caio Fernando Abreu entrou mesmo no hall dos meus escritores favoritos! Conforme acertou na mosca Lygia Fagundes Telles, o autor possuía uma habilidade de encantador de serpentes, atraindo e hipnotizando seus leitores, envolvendo-os nas tramas com as quais eles se deparam nas linhas de seus escritos.

É inevitável o choque que as palavras de Caio F. causam em mim, colocando-me contra a parede da vida, me confrontando com minhas verdades fabricadas. “Tudo que parece meio bobo é sempre muito bonito, porque não tem complicação. Coisa simples é lindo. E existe muito pouco. (...) É que vezenquando dá uma saudade na gente dessas coisas. São todas coisas simples. Meio bobas, muito bonitas”. Como não ter a visão arranhada diante disso?

O corre-corre do dia a dia tem nos empurrado cada vez mais para um vão escuro, no qual nossa visão fica impedida de perceber a magnitude de momentos que, quase sempre, passam despercebidos. Despreparado, nosso olhar deixa de ver relevância nos gestos mais simples, nas coisas mais singelas, aquelas que, certamente, são as mais lindas. É por isso que dá saudade das bobeiras que costumávamos fazer quando não existia a cobrança de sermos máquinas em tempo integral. Sim, senhor. Não, senhor. Onde se perdeu a simplicidade de nossa felicidade?

A graça de aproveitar a beleza das coisas simples da vida está sendo sufocada pela euforia de transformar as horas em fontes de prazer gratuito e descomprometido. Complicamos as relações e aplicamos a fórmula de Báskara até para resolver aquilo que não tem nenhum agravante. Dançamos conforme a música, sem perceber que nós mesmos é que deveríamos assumir a vitrola que embala nossos dias. Coisa simples é lindo, e existe muito pouco porque nós desistimos de existir de verdade uns para os outros.

Um domingo ao lado de quem se ama, uma conversinha sem importância no final do expediente, um café de fim de tarde ao lado de gente querida, se aventurar na cozinha tendo uma boa companhia, curtir um cineminha sozinho, receber uma carta inesperada. O que existe de complicado nestas situações? São todas simples, práticas, e poderiam eternizar momentos de nossas vidas se nós não insistíssemos em acreditar que a vida só tem valor quando muito elaborada. Nosso paladar para estas situações cotidianas se perdeu e é por isso que o gosto amargo da solidão tem chegado a jato na boca de meio mundo.

Dói perceber que a gente sente saudade da vida, que, tão simples, nos observa em silêncio, temendo ser complicada demais e, assim, acabar intragável, sem possibilidades de solução. A beleza de nossos dias pode até ser custosa, mas não custa nada aprender a ser lindos através de momentos assim: simples e belos.

Um comentário:

  1. "UM DOMINGO AO LADO DE QUEM SE AMA, uma conversinha sem importância no final do expediente, UM CAFÉ DE FIM DE TARDE AO LADO DE GENTE QUERIDA, se aventurar na cozinha tendo uma boa companhia, curtir um cineminha sozinho, RECEBER UMA CARTA INESPERADA. O que existe de complicado nestas situações? [...] Nosso paladar para estas situações cotidianas se perdeu e é por isso que o gosto amargo da solidão tem chegado a jato na boca de meio mundo."

    Acho que estou seguindo esta listinha também! Tem muito EU aqui. Adoro!
    Bjo bjo, Dani Malta.

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