terça-feira, 13 de abril de 2010

Desabamentos

Desde semana passada, o Brasil inteiro está acompanhando o drama das milhares de famílias afetadas pelas fortes chuvas que cairam sobre o Rio de Janeiro. Os números da tragédia revelam que os deslizamentos de terra já mataram, até o momento, mais de 230 pessoas, que, segundo consta, viviam em áreas de risco. Poesia numa hora dessas?! Pois é, me parece oportuno.

Filho feio não tem pai; desastres, tragédias ambientais e crimes políticos, também não. Toda vez que um momento como este que o Rio está vivendo é comentado por autoridades políticas, o discurso é o mesmo: os culpados são os moradores, que escolheram áreas de risco para viverem. Mas, em inúmeros destes casos, os proprietários dos imóveis possuem registros legais daquilo que lhes pertence, sendo contribuintes e pagadores dos diversos tributos cobrados por prefeituras e outros órgãos.

Se a culpa é dos governos anteriores, que permitiram a ocupação de pessoas em locais comprometidos, por que o presente, temendo um futuro catastrófico, não se preocupa em transformar aquilo que foi feito no passado? Os desabamentos que assolam hoje o país são consequência do que está soterrado dentro de cada um de nós: a disposição de lutar para construir a realidade que sonhamos.

Por baixo dos panos – e sem causar muito alarde –, a democracia brasileira vem sendo abatida pelos mais diversos deslizamentos de terra. O desabamento da honestidade provoca taquecardia nos valores que deveriam ser cultivados por qualquer pessoa. Tempestades no Congresso Nacional já vêm provocando, há muito tempo, os mais diversos desabamentos, no entanto, nós permancemos alheios a estes ventos, que nos devastam como furacões, levando-nos cada vez mais pra longe do mundo que idealizamos.

2010 é ano de eleições e já ouvi muita gente dizendo que não vai levar este processo a sério, que vai desperdiçar o voto, pois de nada adianta o cuidado na hora de escolher um candidato. Com este pensamento, seguiremos sendo cobertos pela terra de nossa própria esperança, que, inerte e sem sair do lugar, permanecerá morrendo aos poucos. Soterrados todos nós, quem seguirá buscando sobreviventes em meio aos escombros das tragédias?

Já fui acometido por inúmeras chuvas de verão, que fizeram deslizar sobre mim uma quantidade grande de lama e poeira. Tinha gente dentro de casa; tinha eu. Mas, ao optar por construir minha personalidade em uma área apropriada, fugi do risco de ser surpreendido pelos desabamentos. De vez em quando, cai uma terra ou outra, entretanto, nada que me sufoque ou mate minhas convicções. Quando os pilares do que somos e acreditamos desabam é que começa a verdadeira tragédia.

Um comentário:

  1. "...seguiremos sendo cobertos pela terra de nossa própria esperança, que, inerte e sem sair do lugar, permanecerá morrendo aos poucos. Soterrados todos nós, quem seguirá buscando sobreviventes em meio aos escombros das tragédias?"

    Multifacetado, o adjetivo pra você depois dessa crônica. De onde vem tanta lucidez?! Obrigada por deixar meus olhos abertos, afastados da indiferença.

    Bjo bjo, Dani Malta.

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