domingo, 31 de maio de 2009

Queridos Amigos

Há quase um ano entrava no ar, pela Rede Globo de Televisão, uma minissérie escrita por Maria Adelaide Amaral, chamada “Queridos Amigos” que, sem dúvidas, marcou meu 2008. O enredo girava em torno da história de um grupo de amigos que distaciaram-se da realidade uns dos outros devido aos embates da vida e, depois de um longo tempo, por iniciativa de Léo (Dan Stulbach), se reencontram para resgatar as memórias perdidas e tentar reestabelecer a força da amizade do passado. Repressões da Ditadura Militar, emoções e outros dramas permeavam o núcleo principal da obra, que foi brilhante.

Talvez ninguém esteja entendendo o por que de escrever uma crônica sobre uma ficção exibida pela TV tempos atrás. Transferindo a fantasia para a realidade, penso na relação entre os amigos de hoje em dia. Lembro com saudade de alguns queridos amigos que embarcaram em outro trem e deixaram tão somente a dor da saudade aliada a um gostinho de “quero mais”; aliás, quem não mantém intacta tais lembranças? A amizade tem dessas coisas. Se realmente entendessemos o valor e sacralidade que cercam a palavra AMIGO, muitas rupturas seriam evitadas e muitas dores economizadas.

Um amigo não aceita somente as qualidades do outro; pelo contrário, não se pauta nas virtudes para amar, porque tal atitude é fácil de ser tomada. Um amigo compreende os defeitos e sabe que todo mundo erra e merece a chance de acertar. Um amigo sente a dor do sonho desfeito na hora “H”, passa a limpo os tropeços do passado e ajuda na construção de um presente melhor. Um amigo permite até que a gente pense em voz alta na sua presença, sem limitar ou taxar como ridículas nossas exclamações. A amizade não nos enriquece pelo que ganhamos, mas pelo que um verdadeiro amigo revela a respeito de nós mesmos.

Uma amizade não se quebra facilmente! Sendo verdadeira, não se quebra nunca. O que fascina nessa relação, quando vivida intensamente sem máscaras ou falsidades, é a frase: “Sei tudo sobre você e ainda assim, o amo”. Um verdadeiro amigo não desculpa; perdoa. Não grita; fala. Não ofende; repreende. Não agride; ajuda. Um amigo não aconselha apenas sobre como agir; dá pitaco sobre aquela viagem planejada, ajuda nos preparativos do casamento e empresta o ombro em um momento de necessidade. Sabe aquele amigo que te dá carona de vez em quando? Ele também deve te levar pra conhecer o mundo dele e topar conhecer o seu.

A amizade é uma extensão do amor. Já vi amigos homens que envergonham-se de gritar por aí que entre eles existe amor. Pura tolice! Tenho um grande amigo chamado Thiago Cardoso, que me incentivou a traçar essas linhas, a quem mando um forte abraço. Antigamente, antes de iniciar minhas atividades profissionais, costumavamos caminhar juntos todas as manhãs. Ele, assim como Frank, me ensinou algo: um amigo não caminha apenas pelas lojas. Te acompanha em silêncio na dor, entra na pelada contigo e sai do fracasso ao seu lado. Já recebi grandes conselhos na vida, mas um de Bia, personagem interpretada por Denise Fraga na minissérie citada, ficou guardado e compartilho: “Não é o que você vive que importa, mas o modo como escolhe viver”. Até mais, queridos amigos.

domingo, 24 de maio de 2009

O Calendário


Não existe tempo e tampouco hora marcada para que a inspiração apareça e me entregue, de bandeja, as palavras que hão de compôr mais um pensamento, revelado em voz alta. Dia desses, durante uma aula de Linguagem Técnica, na faculdade, li uma declaração interessantíssima de Adriane Galisteu. Foi o suficiente para que várias idéias “pipocassem” em minha mente. A frase foi uma resposta da atriz e apresentadora, ao Jornal do Brasil. Quando questionada sobre, como eram os anos sem Ayrton Senna - namorado da loira na ocasião em que morreu -, Adriane respondeu: “Não existe essa de um ano sem Senna, dois anos sem Senna... Não há calendário para a saudade”.

Por que ainda não inventaram um calendário que indique os dias que faltam para a saudade daquela pessoa tão especial, que não está mais por perto, ir embora? Por que o calendário não nos mostra quanto tempo nos resta de vida ou destaca em vermelho o feriado que vai marcar o término do relacionamento? O calendário é muito prevísivel! Só contém a descrição dos dias do ano que todos já estão carecas de saber. Ele não nos revela se, no próximo sábado, conseguiremos o emprego sonhado ou se aquele amor tão esperado vai aparecer na noite de um domingo chuvoso.

Concordo com Adriane Galisteu. Para os sentimentos não há calendário. Um amor não é esquecido porque o segundo chegou; uma briga não é resolvida porque é feriado nacional e nem a saudade deixa de existir porque já se passaram um ou dois anos. Existem coisas que independem dos dias e horas. Essas somente têm a ver com aquilo que sentimos! Na visão de Mário Quintana, “bendito é quem inventou o belo truque do calendário, pois o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça”. Talvez ele tenha razão.

Justamente porque o calendário da vida não nos mostra datas tão importantes quanto aniversários ou feriados é que há a necessidade de dar a devida importância a cada dia. É impossível prever quando a saudade vai passar, mas é totalmente possível aproveitar ao máximo as oportunidades que recebemos diáriamente de ser feliz. Já que pensei anteriormente em Quintana, quero citá-lo novamente: “A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa. Quando se vê, já são seis horas. Quando se vê, já é sexta-feira. Quando se vê, já é Natal. Quando se vê, já terminou o ano. Quando se vê perdemos o amor da nossa vida. Quando se vê passaram 50 anos! Agora é tarde demais para ser reprovado”.

Ainda concordando com Adriane Galisteu, para a saudade não existe mesmo calendário. Saudade não tem nada a ver com os dias que passam ou com as noites que vêm. Saudade tem a ver com não perceber o futuro que dança perto de nós. Saudade talvez seja o nosso coração indicando para onde quer voltar. E sentimentos assim não têm, em absoluto, nada a ver com calendário. Com a genialidade de um poeta, meu maior sonho era o de alcançar a grandeza de um sábio e entender que um calendário contém apenas as datas prevísiveis de nosso cotidiano. Os demais acontecimentos significantes da vida dependem de critérios individuais e é pessoal a decisão de quando ou onde irão acontecer.

domingo, 17 de maio de 2009

A invenção do século


Seja assistindo TV ou folheando as páginas de jornais e revistas, cada vez mais tenho certeza de que as pessoas se enganam ao afirmar que a invenção do século são os computadores, Ipod’s e demais avanços da tecnologia. Isso é “fichinha” perto da grande criação da atualidade: a arte de inventar dores e fingir algo que, por trás das cortinas, não faz parte da realidade. Ao passo que convivo com mais pessoas me certifico: a invenção do século são os sofrimentos inventados e as mentiras ditas como verdades. Parece que caiu na “graça popular” utilizar desses artifícios para tornar a vida “melhor”.

Dia desses, andando pela rua, encontrei uma amiga que há tempos não via. Com um sorriso estampado, questionei: “Como você está, fulana?”. Ah, se arrependimento matasse... Minha “amiga de tal” passou horas chorando as pitangas da vida e lamentando porque estava chovendo, porque não tinha roupas novas, porque o namoro terminou e, até porque o cachorro latiu, ela resmungou. Pela minha cabeça, um questionamento rodava: “Por que A. reclamava tanto?”. Aos poucos, a resposta veio de bandeja através de seu próprio desabafo.

A. resmungava porque precisava ser notada e suas palavras não passavam de um pedido de socorro. Soavam como a exclamação: “Olha, estou aqui... Existo, tá?”. Inventar, se tornou parte do cotidiano. A gente inventa uma dor pra ganhar um agrado, inventa um personagem para ser aplaudido, inventa uma receita mágica para a felicidade afim de encontrá-la. A gente inventa o sofrimento para buscar a alegria; inventa um amor pensando em esquecer o antigo; cria laços para satisfazer o próprio umbigo. A gente inventa até que não sabe pra ter o prazer de fingir que sabe.

Mas, voltando a minha amiga, ela parecia sofrer da “dor mais doída do mundo”. No ato, lembrei de uma canção de Frejat, que diz: “Você acha que ninguém sofre mais do que você, talvez porque não saiba ao certo o que é sofrer”. No entando, ficar atrelado a uma mágoa é recriar motivos para fazê-la latejar novamente. É como um mecanismo de quem gosta de sofrer: lembrar da dor é fazê-la doer de novo, é abrir a cicatriz e pedir que ela jorre novamente o mesmo sangue. “A recordação da felicidade já não é felicidade; a recordação da dor ainda é dor”.

A gente inventa para alegrar a vida, pensando que fingir faz parte do ser. Inventa para conquistar, pra arrancar delírios da galera. O problema é que, de tanto inventar, acabamos criando um alguém que não existe; ou melhor, habita tão somente em nossos devaneios. De tanto inventar, escapamos da realidade e passamos a viver com mentiras, acreditando nelas e acostumando com elas. A gente inventa pra poupar a alma; inventa porque pensa que assim o peito vai ficar resguardado, protegido. A gente inventa para conservar a vida, que de tanto ser inventada, acaba por perder-se de si mesma.

domingo, 10 de maio de 2009

Passeio no shopping


Ela adorava passear no shopping. Em meio a lojas, perfumes e boutiques, sentia-se disfarçada, imersa em um universo onde não tinha a necessidade de ser ela mesma o tempo todo. Outro ponto positivo nestas rondas entre escadas rolantes e salas de cinema é que encontrava reunidas suas grandes paixões em um só lugar: homens e vestidos. Talvez por desejar tanto estes dois “ítens”, considerados indispensáveis para que sua vida cotidiana ganhasse sentido, ela os tratasse de igual para igual. Ambos, em linhas gerais, eram vistos como “peças do vestuário”, aquilo que serve para disfarçar as imperfeições da alma e fazê-la desfilar sempre bela, ainda que bela não estivesse quase nunca. Eram prioridades.

Entrou em uma loja à procura de um vestido vermelho cintilante, com tons de verde fluorescente. Este serviria para chamar a atenção, para sentir-se viva, desejada. Por sorte, ou azar, não havia nenhuma peça com estas descrições. Mas, havia um outro. Não era como o idealizado, mas, vá lá, ok. “Fico com este”, disse ela, conformada. Este se chamava Bruno. Definitivamente, não sentia a menor atração por ele, no entanto, era o único disponível. Sendo assim, contentou-se, mas não por muito tempo. Os dias passaram e ela percebeu que aquele “vestido” não era dela, não tinha a sua cara. Só o “vestia” por comodidade, pela ausência de outro, por medo da solidão e da companhia de si mesma.

Não deu certo e ela foi à caça novamente. Lojas, boutiques, salas de cinema. O cenário de sempre. “Deve haver outro vestido por aqui”, pensava. Entrou na loja e, logo de cara, notou uma “peça” jogada, triste, no canto da prateleira. Parecia pedir socorro, ajuda. Teve pena. Eduardo era seu nome. Por piedade, “vestiu”. Aquele vestido estava sujo, mal cuidado. “Preciso cuidar dele”, suspirou. Saiu dali se sentindo a mais bondosa das pessoas, o mais humano dos seres. Mandou limpar o vestido, costurou, remendou, fez o que podia e até o que não devia. Até o dia em que sentiu necessidade de usar algo por amor; não por pena. Viu que era boa demais com ele e egoísta demais consigo mesma.

Recomeçou o martírio. Ela sabia que não era daqueles “vestidos” que precisava, mas os queria mais do que qualquer coisa. Este, talvez, era o erro: querer mais os outros do que a si mesma. Resolveu, em um surto psicótico, experimentar todos quanto pudesse. Vestiu Juliano. “Não, não. Este deixa à mostra minhas perfeições, me torna insegura”, decidiu. Próximo: Carlos. “Impossível! Este me faz sentir gorda. É muito bonito e seu brilho me ofusca”, lamentou. “Há algum mais?”, perguntava-se. Havia sim e se chamava Vinícius. “Este é chato, um sentimetalóide nato. Não dá”. Esta foi a conclusão derradeira. E assim seguiu, em busca do vestido que fosse torná-la mais jovem, bonita, elegante, aceita...

Ufa! Ela experimentou até dizer “chega”. Se tivesse ido além de onde foi, se arrependeria ainda mais. Com o tempo, e com as experiências frustradas pela ânsia destruidora de querer encontrar em alguém aquilo que ela mesma havia perdido, percebeu que não encontrou o “vestido” certo porque, no fundo, não sabia o que queria, o que buscava, qual cor preferia. Todos foram escolhidos para tapar buracos na cratera do coração, para disfarçar as lágrimas e conter a solidão de um sábado a noite. Sua ansiedade era o grande algoz da história. Resolveu agarrar a si mesma pelo colarinho e resolver seus dilemas. Os passeios no shopping ganharam novo sentido. E, quanto aos vestidos, estes se tornaram possibilidades.

sábado, 2 de maio de 2009

Perguntas ao tempo


“O tempo não cura tudo. Aliás, o tempo não cura nada. O tempo apenas tira o incurável do centro das atenções”, diz um verso de Martha Medeiros. Algumas coisas, pessoas, momentos e sentimentos saem do centro das atenções, mas, felizmente para uns e, infelizmente para outros, não abandonam completamente o “recinto”. Mesmo que existam apenas de forma abstrata, silenciosa, vez por outra se fazem presentes através de lembranças, recordações, através da saudade e da “presença da ausência”. Embora saiba que não vou obter respostas óbvias ou lógicas, como em uma prova de vestibular, resolvi fazer algumas perguntas ao tempo.


Há quanto tempo você não vê o seu melhor amigo de infância? É, ele mesmo. Aquele que jogava bola no campinho de terra com você, que brincava de pique-esconde e com quem você vivia brigando, mas não suportava sua ausência nem um dia sequer. Vocês juravam que não iriam se separar nunca, no entanto, a poeira dos dias encarregou-se de soterrar aquele sentimento, o que não significa que esteja “morto”. Quanto tempo faz que você não encontra aquela amiga da adolescência? Vocês brigaram em uma noite sórdida de sábado pelo vestido que estava na vitrine da loja da esquina e nunca mais aprenderam a diferença entre o supérfluo e o necessário.

Há quanto tempo você não ouve tocar no rádio aquela música que você odeia porque te lembra muito alguém que você ama, mas que não pode mais estar perto? Quanto tempo faz que você não pega aquele cartão postal e, ao admirar a paisagem, se imagina naquele lugar com alguém? Quanto tempo faz que você não se permite amar novamente? O fato de aquele cafajeste ter te enganado nada tem a ver com o amor. Pobre dele que sempre é o culpado pelos devaneios de nossos companheiros ou pelos enganos das pessoas. Há quanto tempo você não se levanta desta cama? Sem dúvidas, as cores da cidade mudaram e não é paralisada pelo medo que as soluções para os problemas aparecem. Aliás, um alerta aos desavisados: soluções não caem do céu; é preciso buscá-las.

Quanto tempo faz que você derramou aquela lágrima doída porque se lembrou de uma pessoa que amava muito, mas não pode dizer isso a ela? Isto talvez nos faça perceber que não expressar um sentimento hoje pode significar abandoná-lo para sempre no vão e no vazio do que poderia ter sido e não foi. Há quanto tempo você não arrisca, não vira a mesa e sai de cena? Há quanto tempo você não senta, reavalia o jogo e entra na partida? Há quanto tempo você não se permite ser de novo você mesmo, livre de preconceitos e de ideias que algum desocupado estabeleceu como verdades eternas? Há quanto tempo você não perdoa alguém, dando a esta pessoa e a si mesmo uma nova chance?

Para obter a resposta destas perguntas, não adianta pedir ajuda aos universitários, tampouco pesquisar no Google. Talvez porque as respostas não sejam tão importantes. O que importa é o sentimento. Todo mundo já errou um dia, julgou pelas aparências, gritou e se arrependeu, deu adeus e quis voltar atrás, fez alguma coisa quando o coração mandava fazer outra. Então, que diabos podemos tirar disso tudo? Não adianta viver priorizando os erros e defeitos das pessoas; nem sendo compassivo com os outros e implacável consigo mesmo. Ao deitar-se, jogue fora as mágoas e ressentimentos. Seja feliz, faça alguém feliz e se faça feliz o mais rápido que puder. De preferência, hoje.