quinta-feira, 9 de junho de 2011

Carta para alguém que se foi

Você se foi numa manhã qualquer, em que vi o sol nascer no céu, mas se apagar dentro de mim. Não me lembro a hora exata, quantos minutos durou nossa última conversa, só o que sei é que cada um daqueles segundos me custou o tempo de uma vida toda... E de uma morte inteira também. Você partiu, e eu fiz o mesmo: continuei indo, andando, chorando, lamentando, sorrindo, fingindo, desbotando... Desde então, comecei a viver no gerúndio, sempre indo sem saber pra onde, como um piloto automático que assumiu o comando da aeronave porque o piloto dormiu no volante... Até hoje ainda não sei se estou acordado. Por favor, me belisque?

Aquele último adeus que você me acenou ainda não cessou de ser abanado em meu coração. Ainda te vejo de costas, meio de lado, virado pra trás, inclinado para a esquerda, sei lá de que jeito, só sei que não enxergo suas lágrimas nem me lembro se você estava sofrendo, talvez porque as minhas próprias estejam embaçando minha visão e me impedindo de enxergar um palmo na frente do nariz. Se eu ainda choro por sua causa? O tapa que você me deu continua gravado, latejando sem parar, a marca dos seus dedos continua vermelha em minha alma... Nem cinco anos, nem cinco encarnações serão suficientes para que o estalo dos golpes cesse em meus ouvidos. Alguém me empresta um CD novo? Estou cansada de ouvir sua voz.

Se nunca mais fui feliz? Seria muita pretensão sua acreditar nisso, né... É claro que fui, e é justamente isso que me incomoda: não consigo ser feliz por muito tempo. Quando penso que as nuvens se dissiparam de vez e que, finalmente, o Verão voltou de vez pra minha vida, surge de novo o Inverno, sem nem dar tempo de eu me preparar numa Primavera ou num Outono qualquer. Quando dou por mim, minhas folhas já estão ressecadas novamente, meus botões de rosas já deixaram de florescer, minhas pétalas já estão caindo, como se fosse você quem estivesse brincando de bem-me-quer, mal-me-quer... Que pena que nunca mais consegui eu ser a sorteada no bem-me-quero.

Não sei o que tenho a dizer, são muitos sentimentos levantando a mão e pedindo pra falar, tem ódio e amor juntos e misturados querendo a palavra, estou sendo interrompida por vozes minhas que desconheço, calma, calma, que gritaria é essa, hein, gente?! Fiquei histérica desde que você se foi, não bato bem das bolas, deixei de ser feijão com arroz e virei uma salada de frutas: azeda e doce, ao mesmo tempo. Mas, voltando ao que tenho a dizer, e que continuo sem saber, acho que vou cantar pra passar o tempo... Ah, eu já te contei que aprendi a desafinar em inglês? No cursinho, a primeira frase que aprendi a escrever foi “I love you”. Não, não era pra você... Ou era?

Não repare o exagero nas reticências que empreguei nesta carta, pois estes três pontinhos me refletem, são uma pista sobre o meu atual estado de espírito. Desde que você se foi, virei uma mulher reticente, uma frase incompleta que deixa mistérios no ar, uma sentença que termina no meio do nada, um verbo cortado... Olha as reticências de novo aí! Enfim, é melhor eu ir deitar, nem sei por que resolvi escrever este monte de besteiras, só o que sei é que continuo sem ter rumo, meu piloto automático também escangalhou, acho que vou bater... Tomara que, enfim, destroçado meu coração possa voltar a bater inteiro.

De quem ficou,

Guta

2 comentários:

  1. Essa Guta é danadinha, hein?!? Ou será que é o escritor por tras dela?

    Cada vez mais sinto mais orgulho de ter você por perto. Dentro. Sou seu maior fã! Esse texto está perfeito. Mais um para o todo da lista.

    T.A. mais e pra sempre!! s2

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  2. Maravilhoso. Hoje me sinto igualzinha....

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