quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Obrigado por não mudar

Atualmente, vivemos quase um colapso por conta da palavra “mudança”. As pessoas acordam, todos os dias, querendo mudar. É claro que existem momentos da vida em que necessitamos passar por transformações, em que precisamos mesmo de uma bela recauchutagem. Porém, este verbo vem sendo conjugado com uma banalidade incrível, de modo que estamos nos tornando dependentes dele para alcançar o bem estar. Sem mudança, sem felicidade.

Principalmente no final de um ano, esta realidade torna-se ainda mais gritante. Queremos programar nossa listinha de promessas para os doze meses zeradinhos que teremos pela frente, elaborar quais mudanças iniciaremos em nossa vida daqui pra frente. Acontece que, às vezes, não há a menor necessidade de mudarmos – não como uma obrigação. Basta chegar dezembro e a gente começa a inventar um monte de vontades que nem temos, apenas para atender às exigências da época.

Queremos nos programar para comprar um celular novo, sendo que já adquirimos um há menos de dois meses. Queremos pensar em sonhos gigantescos, quando ainda nem começamos a realizar nossas pequenas vontades cotidianas. Queremos emagrecer, mas nem sequer examinamos, previamente, se isso é, de fato, preciso. É justamente o nosso desespero em mudar que nos empurra para as garras do tédio e da constância. Por isso, obrigado por não mudar.

“Obrigado por não mudar a cor do seu cabelo. Sem dúvidas, o tom natural das suas mechas é bastante charmoso. Você não precisa de chapinha nem de tinturas para ser bela; tenho certeza que o mais bonito em você é o seu coração”.

“Obrigado por não mudar de emprego. A proposta que você recebeu para ir pra longe te renderia mais alguns trocados, no entanto, nada paga a oportunidade de vermos nossa filha crescer juntos. O dinheiro é importante, mas a riqueza de nossa menina é mais sublime”.

“Obrigado por não mudar de namorado. Passamos por algumas crises, entretanto, acredito que o amor, quando verdadeiro, sobrevive às tempestades. Fique ao meu lado e vamos ver o céu... Tenho certeza que, em breve, em sol voltará a aparecer por aqui”.

Obrigado por não mudar de endereço, obrigado por não mudar de roupa, obrigado por não mudar de carro, obrigado por não mudar de personalidade, obrigado por não mudar. Nossa obsessão por mudanças nos torna reféns delas, fazendo com que sejamos incapazes de perceber as transformações que surgem, naturalmente, pelo caminho. Quase sempre elas são belas, mas acabam se perdendo por conta do nosso desespero em mudar logo de janela, o que nos impede de apreciar, com calma, as paisagens tão bonitas que já estão diante do nosso olhar.

Mudanças são importantes, mas nem sempre. Há momentos em que nossas vidas são boas do jeito que estão. Portanto, abone as listinhas e deixe para depois as promessas pra 2011. Permita que as mudanças aconteçam de maneira natural, sem se cobrar tanto nem exigir demais de si e dos outros. No próximo ano, tenhamos cuidado para não nos mudar de nós mesmos.

Um comentário:

  1. Fellipe, como sempre você sempre arrasa em seus textos.
    Virei seu fã. Passo sempre por aqui para ler suas crônicas!
    Feliz 2011!
    Abraços

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