quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Flores no sertão

Há assuntos dos quais nós, da Imprensa, não temos como fugir. Em meio à tragédia na região Serrana do estado do Rio de Janeiro, como falar dos golfinhos rosas que cruzam o Atlântico neste momento? Não dá. Vendo as imagens da catástrofe, me vieram à mente sentimentos de tristeza e desolação... Mesmo tendo um olhar treinado para isso, me parecia impossível encontrar belezas naquelas cenas de horror e destruição.

De repente, um bebê é achado com vida, junto com seu pai, dentro do lamaçal; um homem é resgatado, vivo, após mais de 16 horas embaixo da terra; um jovem sobrevive depois de ser levado pela enxurrada por mais de 4,5 km. Em meio à secura daquele sertão de mortes e sementes ingermináveis, flores começavam a brotar. As ajudas desandaram a chegar, em tempo recórde, de todos os cantos do Brasil. Caminhões e mais caminhões, repletos de toneladas de donativos, passaram a ofertar àquela paisagem, triste e escura, um toque de cor e esperança. Por alguns instantes, a chuva na região deixou de cair do céu e começou a sair do coração das pessoas: era uma tempestade de solidariedade. A água de amor irrigou o solo. Mais flores no sertão.

Mesmo nos momentos em que a realidade ao nosso redor parece ter se transformado num deserto, cheio de cactos e banhado por um sol a pino, sempre há maneiras de amenizar o calor escaldante dos sofrimentos e produzir miragens que ofertem poesia ao silêncio que impera. Cada gesto de gentileza e de doação destinado aos sobreviventes da tragédia da região Serrana, bem como a qualquer outra, transforma-se numa semente que, milagrosamente, toca o solo podre e o faz tornar-se fértil. O amor faz nascer flores em sertões mais áridos do que os do Ceará.

Se nos mantemos de braços cruzados, nossas mãos ficam impossibilitadas de semear o bem. Pensando que não podemos fazer nada para transformar terras secas em terrenos próprios para o plantio, deixamos que a inércia tome conta de nós e passamos a tão somente lamentar a ocorrência dos desastres. Tragédia é ter sementes em mãos e não ofertá-las para plantar flores no sertão. Não é miragem nem mágica: é só um pouco de compaixão.

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