segunda-feira, 8 de novembro de 2010

A benção dos humanos

Entre os tantos livros que já li de José Saramago, escritor português morto há alguns meses, “Memorial do Convento” aparece entre os melhores. O ponto de partida dessa trama é a construção de um monumento histórico, ou seja, o convento que aparece no título, fato que se desdobra em um leque de tramas paralelas fabulosas e revela personagens inesquecíveis.

Um deles é o padre Bartolomeu de Gusmão, um religioso que tem um sonho bastante ousado para a época – século XVIII – em que a trama da obra se passa: voar. Para tanto, o homem pretendia construir o que chama de passarola, máquina que lhe proporcionaria o alcance de tal feito. Os detalhes que envolvem essa curiosa invenção podem ser conferidos no livro, mas o que quero destacar é uma frase dita por Bartolomeu num dado ponto da história.

Em meio a um momento de dor e confusão mental, quando dois personagens pedem ao sacerdote que os abençoe, ele retruca: “(...) Abençoem-se antes um ao outro, é quanto basta, pudessem ser todas as bênçãos como essa”. No exato instante em que me deparei com essa intrigante resposta, pus-me a pensar que os milagres que, frequentemente, pedimos ao céu podem estar a um triz de nossas mãos. Quem dera que ao olhar tanto para o alto não perdêssemos a clara noção do que acontece ao nosso lado.

Todos os dias, milhares de pessoas pelo mundo oram e pedem a Deus que as abençoe, correm às igrejas para rogar por feitos espetaculosos, suplicam aos habitantes do reino celestial que olhem para a desordem e caos que se instalaram cá embaixo. Obviamente, cada uma dessas práticas é válida, mas só se concretiza, de fato, quando antes nós abençoamos uns aos outros, fazendo com que Cristo possa agir por meio de nossas mãos.

Há sempre um amigo esperando pela benção de um abraço, existem mendigos aguardando pela benção de um pedaço de pão e de um pouco de atenção, há filhos indo dormir sem serem abençoados pela benção do amor de seus pais, existem pessoas que caminham pela vida sem serem agraciadas com a benção de um amor verdadeiro. Esses milagres, e tantos outros, são passíveis de serem realizados por mim, por você ou por qualquer outra pessoa que carregue no coração a maior graça de todas: a multiplicação da solidariedade e do afeto que remove montanhas.

Muitos fiéis rogam a Deus que sejam abençoados com carros, mansões, empregos, situação financeira estável, namorado honesto, família harmoniosa, no entanto, não se levantam dos bancos das igrejas para tornar real a graça que tanto almejam. Há milagres acontecendo o tempo todo, em silêncio, sem que seja preciso a abertura do Mar Vermelho ou caminhar sobre as águas para que sejam evidenciados. Pudessem ser as bênçãos dos humanos tão grandiosas quanto essas em verdade e graça e não haveria tantas ressurreições sendo evitadas por aí.

Um comentário:

  1. Cris, de novo...rsrsrs

    É amigo...realmente a maioria das pessoas acredita em bênçãos individualizadas, rogam a Deus, ou seja lá qual for a entidade em que crêem, que lhes abençoe com saúde, mesa farta, felicidade no amor, mas por outro lado são capazes dos atos mais terríveis para obter vantagens em diversos setores. Eu não sei se você já conhece essa historinha, ela me emocionou um dia, e já que estamos compartilhando emoções, vou compartiilhá-la com você: (tomara que caiba aqui =D )
    " Conta uma lenda que Deus convidou um homem para conhecer o céu e o inferno.
    Foram primeiro ao inferno.
    Ao abrirem uma porta, o homem viu uma sala em cujo centro havia um caldeirão com uma substanciosa sopa e a sua volta estavam sentadas pessoas famintas e desesperadas.
    Cada uma delas segurava uma colher de cabo muito comprido que lhes possibilitava alcançar o caldeirão, mas não permitia que colocassem a sopa na própria boca.
    O sofrimento era grande.
    Em seguida, Deus levou o homem para conhecer o céu.
    Entraram em uma sala idêntica à primeira: havia o mesmo caldeirão, as pessoas em volta e as colheres de cabo comprido. A diferença é que todos estavam saciados. Não havia fome, nem sofrimento.
    "Eu não compreendo", disse o homem a Deus: "Por que aqui as pessoas estão felizes enquanto na outra sala morrem de aflição, se é tudo igual"?
    Deus sorriu e respondeu: "Você não percebeu? É porque aqui eles aprenderam a dar comida uns aos outros."
    Moral: Temos três situações que merecem profunda reflexão:
    1. Egoísmo: as pessoas no "inferno" estavam altamente preocupadas com a sua própria fome, impedindo que se pensasse em alternativas para equacionar a situação;
    2. Criatividade: como todos estavam querendo se safar da situação caótica que se encontravam, não tiveram a iniciativa de buscar alternativas que pudessem resolver o problema;
    3. Equipe: se tivessem o espírito solidário e ajuda mútua, a situação teria sido rapidamente resolvida.
    Conclusão: Dificilmente o individualismo consegue transpor barreiras.

    Um abraço!!

    ResponderExcluir