quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Pra rua me levar

“Divã” é o livro que mais marcou minha vida até hoje. Escrita por Martha Medeiros - uma de minhas musas inspiradoras -, a história de Mercedez foi parar também nas telonas. No filme, a protagonista ganha vida na pele de Lília Cabral, uma atriz dotada de tanto talento que elogiá-la aqui seria redundante.

A trilha sonora do longa “Divã” o torna uma obra ainda mais completa, onde todos os elementos estão em sintonia, se completam. Entre as músicas que embalam as idas e vindas de Mercedez está “Pra rua me levar”, sucesso consagrado na voz de Ana Carolina.

A canção mencionada dá o tom das cenas finais do filme. “Vou deixar a rua me levar, ver a cidade se acender...” É ao som destes versos que Mercedez sai de cena; é com eles que vou entrar: também quero que a rua me leve.

Vou deixar a rua me levar até onde meus pés nunca pisaram por medo, até onde minhas mãos nunca tocaram por frieza, até onde meus olhos nunca alcançaram por falta de idealismo. Quero que a rua me leve aos meus caminhos mais desconhecidos, me ajude a encontrar meus mananciais mais secretos e escondidos, que por isso mesmo são os mais límpidos e claros. Vou deixar a rua me levar para o que não conheço e recuso pelo excesso de lucidez.

Vou deixar a rua me levar para onde nunca fui, para caminhos que já conheço mas quero redescobrir, para pessoas que já amo mas quero reencontrar, para gostos que já sei mas quero saborear novamente. Vou com a rua experimentar os meus excessos, na tentativa de conseguir contê-los, antes que eles contenham a mim. Quero que a rua me leve aos mendigos que sou quando suplico pelo amor de alguém, às prostitutas em que me transformo quando vendo minhas opiniões e mantenho-me alheio a minha própria vontade, aos assaltos que realizo quando roubo de alguém o direito a verdade. Vou deixar a rua me levar para o que sou e desprezo pelo excesso de hipocrisia.

Quero que a rua me leve aos becos e vielas, complexos e favelas, jardins e precipícios, vidas e desperdícios. Vou ao encontro do que perdi tentando encontrar nos outros o tom da minha própria melodia, vou em direção ao que construí em terrenos que não me pertencem, ao que entreguei de bandeja nas mãos de destinatários errados. Com a rua quero encontrar o sórdido, o imperfeito, o que não é límpido em mim mas insisto em disfarçar, o que não sinto mas cismo em inventar, o que não quero e acabo por aceitar. Vou deixar a rua me levar para os personagens que me tornei não sendo eu.

Quero que a rua me leve ao amor que não cala pelo receio de ser vivido, até onde não se morre por medo da vida, ao local onde esquecemos que o essencial só faz diferença quando dito.

Vou deixar a rua me levar, e quando a cidade se acender a lua vai banhá-la, me lembrando de que meu maior desejo será sempre o de ser iluminado por dentro para conviver bem com as curvas das ruas que me conduzem pra fora.

3 comentários:

  1. "Quero que a rua me leve ao amor que não cala pelo receio de ser vivido"

    medo é normal mesmo ter
    mas é como meu irmão disse ontem,
    a vontade de arriscar algo e esperança pra que tal coisa dê certo tem que ser muito maiores
    porque ai sim você vai poder seguir em frente e continuar crescendo com cada experiência boa ou ruim de ter ao menos tentado encontrar um rumo certo pra seguirmos.

    eu encontrei o meu e tinha medo de arriscar,
    mas desisti desse medo pra poder ser feliz !
    Espero que você encontre o seu logo ! o/

    mais uma vez Parabéns irmão! :D

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  2. Que bom que as ruas têm curvas, que as paisagens ao seu lado mudam e que nos dá a opção de escolher o caminho que achamos ser o melhor.
    Você é demais!!! Te adoro!!!

    Igor Cardoso

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  3. Nossa perfeito.. Duas pessoas excepcionais.. Unicas.. tao diferentes e tao iguais com as palavras... Amo mt Ana.. nossa ela manda mt...
    E na forma mais perfeita do conjunto da "obra" vc, fechando com chave de ouro as palavras que tocam a alma!!
    bjim adoro-te
    (Bárbara Terra)

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