sexta-feira, 1 de março de 2013

Aquele do Vaticano


Passei boa parte do dia acompanhando os momentos finais do pontificado de Bento 16, desde a última reunião com os cardeais até o vôo derradeiro que o levou para fora do Vaticano, e para dentro do meu coração. Confesso que chorei com a despedida, porque descobri tarde demais que o jeito sisudo de sorrir daquele senhor parece com o do meu avô, porque tive que dar adeus a um homem pelo qual só me deixei cativar no último abraço. Passei oito anos ignorando as palavras de um sábio, que se fez calvário pela ressurreição de sua igreja.

Com todo respeito, Bento, me permita chamá-lo assim, sem formalidades, pois foi somente no cair das vestes que você me conquistou. Foi quando você trocou o trono pela oração que lhe reconheci rei. Despido das vestes litúrgicas, pude lhe ver humano, frágil, e descobri que você sofre como eu, que também renuncia aos espinhos que não produzem mais flores, que também caminha devagar, apoiado numa bengala, porque tem limitações como as minhas. Queria não ter que dizer adeus agora, papa, já que nosso encontro acabou de acontecer. Ainda há tempo para uma última benção, antes de a pedra ser colocada?

Se houver, me deixe dizer que eu adoraria passar algumas horas navegando na barca, ao seu lado, ouvindo palavras sobre pescarias de vidas, aprendendo como manter a firmeza nos momentos em que as ondas parecem quase perfurar o casco da embarcação. Não se vá ainda, Bento, não sem antes eu lhe dizer tu és Pedro, pedra sobre a qual edificarei, daqui pra frente, meu modelo de humildade e coragem. O tempo é pouco, eu sei, mas, apenas me fale um pouco mais de Deus, me convença de que o Senhor está aqui, mesmo nos momentos em que Ele parece dormir.

Lamento, meu papa querido, ter negligenciado seu poder de liderança, e só agora, no beijo de despedida, me dar conta de que sua humanidade escancarada é o exemplo mais fiel de que Deus também acolhe a mim, quando não suporto certos pesos e renuncio. O Senhor me recebe, mesmo quando abandono o barco e fico a observar o mar, mesmo quando os espinhos me fazem desistir... 

Estamos juntos na cruz, Bento. Você nos ensinou que ela jamais se acaba, mas, que não é vergonha gritar quando os pregos perfuram nossas esperanças, e dos sonhos restam apenas chagas vivas. Lamento profundamente só lhe ter descoberto diante da lápide, no entanto, agradeço ao senhor, papa, por ter nos apresentado um céu mais possível, no qual podemos entrar mesmo quando se renuncia.

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